Canto do Inácio

Saturday, December 19, 2009

"TRUE LIES" ACHA VERDADE ATRAVÉS DA MENTIRA
INÁCIO ARAUJO

O filme de grande maquinário hoje pode ser considerado um gênero do cinema americano. É essa espécie de filme em que o espetáculo se apresenta em estado puro, tendo como fundamento a pura impossibilidade "disso" acontecer na realidade.

Em "True Lies", o momento da grande ilusão acontece quando o terrorista Aziz, fugindo do espião Harry Tasker (Arnold Schwarzenegger), atira-se do alto de um prédio com sua moto. E cai, são e salvo, numa piscina.A ação continua: Harry tenta seguir Aziz, mas o cavalo em que está montado (sim, ele está montado em um cavalo) refuga. Efeito de real introduzido em plena fantasia de maquinário: cavalos refugam, o que leva Harry a ser projetado para frente e quase cair do prédio.

O mesmo tipo de efeito se viu há pouco em "O Fugitivo", ou em "Velocidade Máxima". Mas "True Lies" tem uma enorme vantagem, ao menos em relação a este último: tira proveito do maquinário, mas faz questão de tomar distância em relação a ele.

Isso é que torna verdadeiras as mentiras do filme. Mentiras que já começam na história, onde Harry é espião para uma ultra-secreta agência dos EUA. Tão secreta que durante anos a fio sua mulher Helen (Curtis) pensa que ele é um dedicado vendedor. Tão dedicado que nunca aparece em casa. É o que leva Helen a iniciar um flerte com Simon (Bill Paxton), um vendedor de carros usados que se faz passar por... espião.

E aí a história de espionagem (baseada em um filme francês de Claude Zidi, de 1991) meio que desaparece, dando lugar a essa segunda ficção, em que Arnold mobiliza metade da agência para espionar Helen, detectar a extensão dos chifres e coisas assim.

É claro que em dado momento volta-se à intriga central, inclusive para o final delirante, puxado a trucagens formidáveis em que, entre outras, um avião invade um prédio.

É ao investir no desvendamento da trapaça que constitui o uso indiscriminado do maquinário de cinema (megaorçamento, efeitos especiais, trucagens) que "True Lies" consegue sacudir a poeira do cinema ilusionista e fugir da monotonia dos filmes feitos em função das trucagens (como "O Exterminador do Futuro 2", do próprio Cameron) ou da ação irrefreada.

Em vez disso, o investimento no humor ganha uma dimensão a que o cinema de aventura parecia ter abdicado. Isso acontece em parte porque, há tempos, Schwarzenegger trata de suavizar sua imagem de brutamontes (e em se aperfeiçoar como ator). Aqui, tanto ele é capaz de usar a metralhadora sem fazer cerimônia, como de dançar o tango (com Tia Carrere, bandidona sexy e vulgar).

Mas quem defende a parte de humor é mesmo a ótima Jamie Lee Curtis, comediante que acerta um sucesso e em seguida se esconde atrás de meia dúzia de abacaxis. No conjunto, "True Lies" é um filme que justifica a Hollywood dos grandes espetáculos: tira todo proveito da máquina, sem ser maquinal; e sabe como usar a inteligência para buscar verdades na mentira cinematográfica.

(texto publicado na Folha de S. Paulo do dia 02 de setembro de 1994)

1 Comments:

  • Tia Carrere era um mulherão e ficou mais gata ainda. É daquelas que o tempo só melhora. Dá vontade de ser cineasta pra fazer filmes só pra ela brilhar. Aina dá pra ver ela na tv band na série "caçadora de relíquias", nada de mais, só que tem Tia Carrere e aquele corpaço! Uhu!

    By Blogger teros, at 10:54 PM  

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