"NÁUFRAGOS" TRAZ O CINEMA SUBLEVADO DE MOULLET
INÁCIO ARAUJO
Vez por outra é obrigatório recomendar um filme que nunca se viu. É o caso de "Os Náufragos da D17", de Luc Moullet.
Para começar, os filmes de Luc Moullet nunca passam no Brasil, de maneira que não só o filme, mas todo o trabalho de seu realizador é uma raridade.
Depois, segundo a sinopse da TV5, estamos em uma guerra no Golfo (o filme é de 2002), numa região desértica da França, onde dois amigos ficam com o carro encalhado.
A partir daí se dá uma série de encontros com personagens não inusitados em si, mas cuja convivência num mesmo filme os torna especialmente interessantes e raros: um astrofísico, uma equipe de cinema (rodando um faroeste), militares, geólogos etc.
Do que podemos esperar um show de anarquismo cinematográfico, já que Moullet, desde seus tempos de crítico do "Cahiers du Cinéma", nos anos 60, viu o cinema como exercício de extrema liberdade.
Foi isso que praticou em um de seus primeiros filmes, "Les Contrebandières" (As Contrabandistas, 1967), embora ali a bagunça vencesse o cinema claramente. Nos anos 80, chegaram até nós alguns documentários seus, entre eles o excepcional "Barres" (Barras, 1984), sobre as pessoas que pulam as catracas do metrô de Paris e os diversos métodos que criam para burlar a fiscalização.
É algo desse estofo que se pode esperar de "Os Náufragos da D17", pois é improvável que Moullet tenha abandonado nos últimos anos seu espírito de insurreição contra as instituições em geral e as cinematográficas em particular.
O que esperar? O melhor ou um filme deficiente? De Moullet pode vir tudo. Mas o cinema é também essa expectativa (será bom ou não?), e não para quem prefere a segurança do "fast food".
(texto publicado na Folha de S. Paulo do dia 17 de agosto de 2003)
0 Comments:
Post a Comment
<< Home