INÁCIO ARAUJO
Filmes podem enganar. A primeira visão, e também a segunda, de "Onde os Fracos Não Têm Vez" me impressionaram vivamente: o filme dos Coen parecia vibrar a cada cena e, embora a situação central (sujeito acha dinheiro que não lhe cabe e é perseguido implacavelmente) seja banal, a figura de Javier Bardem, o demoníaco perseguidor, é memorável.
Com o tempo, no entanto, as virtudes se distanciaram. A memória me restitui um filme bem à moda dos Coen: reciclagem oportunista de um cinema antigo, sem nada de novo em especial a dizer.
Já seu filme seguinte, a comédia "Queime Depois de Ler", me impressionou muito menos, mas com o tempo cresce na lembrança e na estima, e a situação central (mulher arma um grande golpe apenas para fazer as mil plásticas a que a induz seu médico) parece dizer muito mais sobre o mundo de hoje do que o outro.
É uma experiência absolutamente subjetiva, mas talvez nem tanto: quem chega hoje ao cinema mal pode acreditar no prestígio que um dia teve William Wyler e nem desconfia que Hitchcock era, para todos os efeitos, só um cineasta comercial. Hoje a publicidade é agressiva na busca da mitificação de "autores". Mas muita água vai rolar antes que saibamos qual o lugar dos Coen nessa história (a do cinema).
(texto publicado na Folha de S. Paulo do dia 22 de fevereiro de 2009)
2 Comments:
Curioso pensar no presente avaliado pela história... Gombrich faz uma observação semelhante a respeito de Gaugin, Cézanne e Van Gogh, em seu livro A historia da arte. Sobre os irmaos Coen, no entanto, acredito que seus filmes terão uma sobrevida bastante longa, maior do que Beco sem saida, por exemplo, para mencionar um bom Wyler.
By Bruno Cursini, at 4:28 PM
Diego, coloca o texto que o Inácio espinafra o Slumdog Millionaire. Ajuda a dar uma resposta à vitória desse filmezinho de merda (literalmente, a julgar por uma das cenas). Abraço!
By Unknown, at 7:08 PM
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