PROFETA ESTÁ ENTRE O MODERNO E O ARCAICO
INÁCIO ARAUJO
É na tensão entre velho e novo, crendice e industrialização que se instala o terrível terror de Mojica. Ao contrário do horror anglo-saxão, Mojica não mobiliza nossos fantasmas. A ênfase de seus filmes não vai, digamos, para os mortos que voltam à vida; ao contrário: a passagem para o mundo dos mortos é que é problemática.
Esses aspectos convivem com a mania de grandeza do Zé, que vive em busca da mulher perfeita para procriar o filho perfeito.
Não se trata de uma variante do super-homem, seja qual for. É mais a versão delirante do velho "sabe com quem está falando".
Mojica fala a uma população pobre, a quem os poderosos infundem horror. Ele observa as crendices como formas contraditórias: são defesas contra o poder dos poderosos, mas inviabilizam a esperança de alforria.
Daí o ar ambíguo de Zé do Caixão: com sua imensa cartola negra, ele é um pouco o iluminista que exalta as descobertas da ciência contra o atraso religioso.
É, ao mesmo tempo, uma representação cruel do atraso nacional: é uma caricatura do discurso bacharelesco, de uma oligarquia que se acredita aristocracia.
Zé do Caixão é bem menos profeta da fome do que profeta de uma modernidade sempre vislumbrada e nunca alcançada.
(texto publicado na Folha de S. Paulo do dia 30 de setembro de 1997)
INÁCIO ARAUJO
José Mojica Marins é o cineasta-antropófago por excelência. Inventou o terror brasileiro, mastigou a influência recebida desde que via filmes, na infância. Criou uma obra original.
É na tensão entre velho e novo, crendice e industrialização que se instala o terrível terror de Mojica. Ao contrário do horror anglo-saxão, Mojica não mobiliza nossos fantasmas. A ênfase de seus filmes não vai, digamos, para os mortos que voltam à vida; ao contrário: a passagem para o mundo dos mortos é que é problemática.
Esses aspectos convivem com a mania de grandeza do Zé, que vive em busca da mulher perfeita para procriar o filho perfeito.
Não se trata de uma variante do super-homem, seja qual for. É mais a versão delirante do velho "sabe com quem está falando".
Mojica fala a uma população pobre, a quem os poderosos infundem horror. Ele observa as crendices como formas contraditórias: são defesas contra o poder dos poderosos, mas inviabilizam a esperança de alforria.
Daí o ar ambíguo de Zé do Caixão: com sua imensa cartola negra, ele é um pouco o iluminista que exalta as descobertas da ciência contra o atraso religioso.
É, ao mesmo tempo, uma representação cruel do atraso nacional: é uma caricatura do discurso bacharelesco, de uma oligarquia que se acredita aristocracia.
Zé do Caixão é bem menos profeta da fome do que profeta de uma modernidade sempre vislumbrada e nunca alcançada.
(texto publicado na Folha de S. Paulo do dia 30 de setembro de 1997)
2 Comments:
Oi, Inacio,
eu me chamo Bruno Carmelo, estudante de cinema. No momento, faço meu mestrado na universidade francesa Sorbonne Nouvelle, e estudo a critica de cinema (a partir do "manifesto" de alguns cineastas contra a critica em 1999).
Para um capitulo da dissertação, eu gostaria de conversar com alguns criticos brasileiros, e para isso eu queria saber se você aceitaria responder três perguntas sobre o assunto.
Eu lembro que elas não serão publicadas em lugar algum, ficando restritas à dissertação e disponiveis unicamente na biblioteca da faculdade.
Espero que possa contribuir.
Agradeço.
BRUNO CARMELO
brunocarmelo@gmail.com
By Bruno Carmelo, at 8:23 AM
Nada mais a acrescentar, como sempre.
By sensei allegro, at 5:33 AM
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