BRIAN DE PALMA BUSCA A VERDADE DE UM GRITO
INÁCIO ARAUJO
Tudo se passa em "Blow Out - Um Tiro na Noite" como se o mundo resistisse à representação. Como se repeti-lo, imitá-lo, fosse uma violência à qual a realidade não se acomoda.
Do outro lado, existe o artista. Ou que nome se queira dar a um técnico de som de filmes pornográficos. John Travolta, em suma. Diante da cena em que uma mulher é morta, ele tem a tarefa de descobrir uma voz, um grito correspondente à imagem na tela. A imagem de uma mulher sendo morta.
Um mais conformista, ou mais conformado, escolheria uma boa dublagem e encerraria aí sua busca. Mas estaria no domínio do realismo, não do real. Travolta sabe que o verossímil é uma coisa - é o que parece verdadeiro - e a verdade, outra.
Eis aí seu dilema: ser verdadeiro, não verossímil, não falsamente verdadeiro. Daí deriva toda a aventura que se segue. Mas o importante é a atitude dos profissionais, sobretudo o técnico de som: ele não está preocupado com o público. Ele sabe, a rigor, que o público está interessado nos peitos da atriz, e não no seu grito. Mas o profissional respeitável não trabalha para o público, e sim para sua arte.
É indiferente que esteja fazendo um pornô ou "Lawrence da Arábia": ele está em busca do bom filme, da verdade. Ele não se contentará com a mera convenção.
Não dá para resumir a história desse filme. Quem não viu perderia a surpresa final. Mas quase todo mundo viu e sabe como, ironicamente, a vida se encarregará de satisfazer às buscas de Travolta, e o quanto isso lhe custará.
"Blow Out - Um Tiro na Noite" é um filme inesperado, pois raramente se fez filmes sobre um grito. É também um dos grandes filmes dos anos 80 e talvez o melhor feito por seu autor, Brian de Palma. Um filme a ver ou rever.
(texto publicado na Folha de S. Paulo do dia 14 de setembro de 2003)
INÁCIO ARAUJO
Tudo se passa em "Blow Out - Um Tiro na Noite" como se o mundo resistisse à representação. Como se repeti-lo, imitá-lo, fosse uma violência à qual a realidade não se acomoda.
Do outro lado, existe o artista. Ou que nome se queira dar a um técnico de som de filmes pornográficos. John Travolta, em suma. Diante da cena em que uma mulher é morta, ele tem a tarefa de descobrir uma voz, um grito correspondente à imagem na tela. A imagem de uma mulher sendo morta.
Um mais conformista, ou mais conformado, escolheria uma boa dublagem e encerraria aí sua busca. Mas estaria no domínio do realismo, não do real. Travolta sabe que o verossímil é uma coisa - é o que parece verdadeiro - e a verdade, outra.
Eis aí seu dilema: ser verdadeiro, não verossímil, não falsamente verdadeiro. Daí deriva toda a aventura que se segue. Mas o importante é a atitude dos profissionais, sobretudo o técnico de som: ele não está preocupado com o público. Ele sabe, a rigor, que o público está interessado nos peitos da atriz, e não no seu grito. Mas o profissional respeitável não trabalha para o público, e sim para sua arte.
É indiferente que esteja fazendo um pornô ou "Lawrence da Arábia": ele está em busca do bom filme, da verdade. Ele não se contentará com a mera convenção.
Não dá para resumir a história desse filme. Quem não viu perderia a surpresa final. Mas quase todo mundo viu e sabe como, ironicamente, a vida se encarregará de satisfazer às buscas de Travolta, e o quanto isso lhe custará.
"Blow Out - Um Tiro na Noite" é um filme inesperado, pois raramente se fez filmes sobre um grito. É também um dos grandes filmes dos anos 80 e talvez o melhor feito por seu autor, Brian de Palma. Um filme a ver ou rever.
(texto publicado na Folha de S. Paulo do dia 14 de setembro de 2003)
3 Comments:
Olá, Inácio
Te convido a conhecer o recente blog de cinema de Juiz de fora, do qual faço parte.www.juizdeforacidadeaberta.blogspot.com.Abraço
By A.C., at 5:36 PM
É o meu De Palma preferido.
By Ivan, at 1:43 PM
O meu De Palma de cabeceira também. De certo modo, essa minha preferência foi influenciada por outra: "Blow up", do Antonioni, do qual "Blow out" é um (sem ser pejorativo) decalque.
By Anonymous, at 10:24 AM
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