UMA DECEPÇÃO
INÁCIO ARAUJO
O filme do Reinaldo Pinheiro foi, para mim, a decepção do ano.
Eu tinha gostado muito do filme anterior dele, o "BMW Vermelho", e achei que "Minha Vida Não Cabe Num Opala" teria algo a ver.
Mas é o oposto. Que terá acontecido? Tenho a impressão de que ele embarcou na onda do cinema brasileiro de pobre, onde cada pobre (da pequena classe média em diante) carrega dentro de si uma interminável sordidez.
Claro, isso deve ser culpa do capitalismo, das elites, etc. O fato é que os caras desumanizados são os pobres. Em metade do cinema brasileiro é assim que funciona.
Pessoalmente, isso não me interessa nem um pouco. O que me interessa é: quem será esse sujeito mulato e de expressão muito digna que passou ao meu lado de manhã, levando sua pasta de trabalho?
Porque, por incrível que possa parecer a quem só conheça o mundo através dos nossos filmes, a população pobre não é constituída essencialmente de bandidos, perversos e outras coisas. Eles existem, claro, mas não desse jeito.
Bem, se a coisa não me interessa em si, que dirá esse apanhado de clichês? Tudo é clichê: o ferro velho, o boxe, a churrascaria, o dono da churrascaria: tudo parece de segunda mão. Nada tem verdade.Em vez de box, devia tratar de Vale Tudo. Me parece que é assim que a coisa funciona.
Como eu dizia, o filme anterior do Reinaldo era o oposto disso, tinha carinho pelos personagens. Então, me parece que ele foi atrás de alguma coisa capaz de conseguir financiamento, de estar numa certa moda. Pode ser. Mas, desculpe, não dá.
4 Comments:
E o Linha de Passe, hein? Cafona aquele "olha pra mim" na cena do carro. Acho sintético do filme, carinho por personagem é o que não falta ali, até sobra...
By Unknown, at 11:38 AM
A "vaca sagrada" Cidade de Deus tem muito desses estereótipos a que se referes,Inácio.O Walter Lima Jr chamou esse cinema de algo feito para o mercado(sobretudo externo) como visão folclorista do país....me lembro do frisson inócuo causado pela questão da indicação do Cidade de Deus ao Oscar e escrevi à época um texto comentando essa folclorização, essa visão estereotipada do país,cujo protagonista é o bonzinho que consegue se manter à parte dessa "realidade".
By Anonymous, at 3:31 PM
Grande texto; admirável limpidez.
By Anonymous, at 9:10 AM
você chegou a assistir a peça do Mario Bortolloto? totalmente diferente. Irônica, triste e engraçada na medida, não peca no clichê pobre, o negócio lá é outro.
bj
By Anonymous, at 3:21 PM
Post a Comment
<< Home