INÁCIO ARAUJO
Não fosse por conhece Catherine Arnaud, provavelmente eu não tivesse ido ver o filme, o que não impede que "Sidney Poitier" seja uma bela surpresa.
O documentário consegue aliar três instâncias de história: pessoal, do cinema e do racismo.
Há o jovem Poitier que se impõe numa Hollywood de pós-guerra, quase sorrateiramente, mas de todo modo representando uma mudança nos modos de relacionamento entre brancos e negros.
Entre filmes maiores e menores, importa aqui a possibilidade de um personagem negro se impor.
O segundo momento é pós 55, depois que começam os conflitos raciais, e o personagem passa a expressar, assim como o ator, as inquietações da população negra diante da exclusão, das humilhações, ku-klux-klan e o escambau.
Por fim, vêm os anos 60. O Oscar, Adivinhe quem Vem para Jantar, de certa forma a aceitação do negro bom, que sabe o seu lugar. Esse é o tipo que cabe a Poitier representar, num momento em que Malcolm X, Panteras Negras etc. levam a questão a uma radicalidade que ultrapassa Poitier.
Esse retrato em movimento é de uma rara inteligência e de uma rara beleza também, que se abre a Poitier com toda a ambigüidade que pesa sobre um homem que, em dado momento da história, representa algo muito maior do que um só pode ser: uma etnia, uma comunidade, um povo, em última análise.